Pesquisadores acreditam que festa tem 300 anos na região oeste do Pará.
Não há certeza sobre local de origem, mas festa sobrevive em Alter do Chão.
A festa do Sairé, realizada todos os anos no mês de setembro na vila de Alter do Chão, distrito deSantarém, no oeste do Pará, em 2014, tem programação prevista para 11 a 15 de setembro. Antes da abertura oficial, há o ritual da busca dos mastros realizado pelos moradores da vila. O evento é marcado pelo religioso e profano, com ladainhas e rituais que lembram os povos indígenas, além do Festival dos Botos, no qual é encenada a lenda regional.
Origem
Alguns pesquisadores acreditam que o evento tenha 300 anos. De acordo com o que a historiadora Terezinha Amorim escreveu em seu livro “Sairé: uma manifestação cultural do povo Borari”, o evento religioso era realizado pelos índios em vários lugares da Amazônia para homenagear os colonizadores portugueses.
Alguns pesquisadores acreditam que o evento tenha 300 anos. De acordo com o que a historiadora Terezinha Amorim escreveu em seu livro “Sairé: uma manifestação cultural do povo Borari”, o evento religioso era realizado pelos índios em vários lugares da Amazônia para homenagear os colonizadores portugueses.
O historiador padre Sidney Canto afirma na obra “Alter do Chão e Sairé: contribuição para a história”, que a manifestação foi uma espécie de intervenção dos missionários jesuítas para introduzir o cristianismo nos nativos da região.
Terezinha explica em seu livro que o ritual consistia numa procissão para conduzir o Sairé, objeto em forma de semicírculo produzido de cipó e coberto por algodão enfeitado com fitas e flores regionais. Após a procissão, era ainda feita reza e jantar com comidas típicas da Amazônia. Em seguida, havia queima de fogos.
Introdução da festa em Alter
Segundo os historiadores, a introdução do Sairé em Santarém e Alter do Chão foi feita pelo padre jesuíta italiano João Maria Gorzoni, no século XVII, ensinando os índios a fabricar e tocar instrumentos musicais.
Segundo os historiadores, a introdução do Sairé em Santarém e Alter do Chão foi feita pelo padre jesuíta italiano João Maria Gorzoni, no século XVII, ensinando os índios a fabricar e tocar instrumentos musicais.
De acordo com a pesquisa do padre Sidney Canto, os dois relatos mais antigos do Sairé em Alter do Chão são de 1951, feita por Nunes Pinto, e outro no início dos anos 1980, feito pelos professores João de Jesus Paes Loureiro e Violeta Refkalefsky Loureiro, citando a senhora Nice Lobato Gonçalves com algumas pequenas divergências entre ambos os relatos. Segundo Canto, de acordo com os registros históricos na região do Baixo Amazonas conseguidos por ele, o Sairé mais antigo era realizado em Vila Franca. Ele é enfático em afirmar que não encontrou nenhum documento que afirmasse o nascimento da festa em Alter do Chão, mas que o Sairé desapareceu dos demais lugares em que existia antigamente.
Definições e personagens
Para o padre Sidney Canto, autor da mais recente obra sobre a questão, a palavra Sairé é definida pelo símbolo ou armação feita de madeira ou cipó; pela procissão feita com o símbolo conduzido por uma mulher acompanhada de tambores e cânticos para saudar as autoridades; e pela festa realizada após a procissão.
Para o padre Sidney Canto, autor da mais recente obra sobre a questão, a palavra Sairé é definida pelo símbolo ou armação feita de madeira ou cipó; pela procissão feita com o símbolo conduzido por uma mulher acompanhada de tambores e cânticos para saudar as autoridades; e pela festa realizada após a procissão.
Proibição e resgate
O padre esclarece que na década de 1940 o Sairé foi proibido porque havia abusos nos rituais sem consentimento das autoridades religiosas, com a inserção de jogos e vendas de bebidas alcoólicas que quase sempre provocavam brigas e mortes. Além disso, havia exploração econômica em nome da religião.
O padre esclarece que na década de 1940 o Sairé foi proibido porque havia abusos nos rituais sem consentimento das autoridades religiosas, com a inserção de jogos e vendas de bebidas alcoólicas que quase sempre provocavam brigas e mortes. Além disso, havia exploração econômica em nome da religião.
Depois de 30 anos de proibição, os moradores da vila resolveram resgatar o Sairé como manifestação folclórica em 1973 desvinculada à Igreja Católica, sendo celebrada junto com a festa de Nossa Senhora da Saúde, padroeira da vila. Segundo Sidney Canto, o Sairé passou a ser realizado fora do contexto histórico e cultural a qual inicialmente foi proposto: a catequese.
Festival dos Botos
Em 1997, foi introduzido o Festival dos Botos, disputa entre as associações folclóricas Tucuxi e Cor de Rosa, na qual encenam a lenda do golfinho de água doce que se transforma num homem bonito, seduz e engravida as mulheres.
Em 1997, foi introduzido o Festival dos Botos, disputa entre as associações folclóricas Tucuxi e Cor de Rosa, na qual encenam a lenda do golfinho de água doce que se transforma num homem bonito, seduz e engravida as mulheres.
Segundo Canto, o Festival dos Botos foi copiado do Festival dos Bois de Parintins (AM), causando também a mudança de local de realização do Sairé, saindo da ramada montada ao lado da Igreja de Nossa Senhora da Saúde para ser realizado no Sairódromo, abolindo assim várias danças folclóricas, sendo introduzidos shows de músicos de renome nacional.
Para a historiadora Terezinha Amorim, a introdução do Festival dos Botos foi a maior de todas as inovações ocorridas ao longo de mais de 300 anos de existência do Sairé, sendo a encenação de “uma das mais belas e mais tradicionais lendas da Amazônia”.
No Lago Verde, a encenação gira em torno da sedução, morte e ressurreição do boto, tendo como personagens a Cunhantã-iborari, a Principaleza do Lago Verde, a Rainha do Sairé, o Tuxaua, o Pajé e os pescadores. O boto é morto por ordem do pai (tuxaua) da moça (Cunhã-borari) seduzida e engravidada pelo boto. A fúria dos maus espíritos da região recaem sobre Tuxaua que pede ao Pajé que ressuscite o boto.
Terezinha acredita que, mesmo com a perda da originalidade do Sairé com a introdução dos elementos profanos, as inovações deram mais empolgação e estimularam mais a visita de pessoas a Alter do Chão.
Para a antropóloga da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Luciana Carvalho, que participou de um estudo conduzido pela universidade em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para tentar resgatar as origens do Sairé, todas as manifestações culturais passam por sucessivas transformações ao longo do tempo, embora sejam mantidas algumas tradições e outras vão sendo adaptadas. “As pessoas tendem a dividir como profano e religioso, mas acho que não tem muito sentido. Na verdade, tudo isso é a festa. Hoje, o que é religioso era considerado profano há 40 anos atrás”, acredita.
Polêmica grafia com ‘s’ ou ‘ç’
A forma de se escrever o nome da festa é polêmica, uma vez que há quem defenda o ‘s’ inicial ou o ‘ç’ para iniciar a palavra, apesar de esta segunda opção não fazer parte da maneira formal da língua portuguesa. Em 1997, a grafia com ‘ç’ foi introduzida na palavra, mas retirada em 2004, tendo retornado em 2013.
A forma de se escrever o nome da festa é polêmica, uma vez que há quem defenda o ‘s’ inicial ou o ‘ç’ para iniciar a palavra, apesar de esta segunda opção não fazer parte da maneira formal da língua portuguesa. Em 1997, a grafia com ‘ç’ foi introduzida na palavra, mas retirada em 2004, tendo retornado em 2013.
De acordo com a obra de Sidney Canto, a grafia correta é mesmo com ‘s’, rebatendo assim a afirmação da origem no dialeto amazônico nheengatu. Ele se baseia em vários documentos antigos para chegar à conclusão. Segundo ele, o nheengatu e o tupi não eram línguas indígenas, mas foram criadas para a comunicação entre os colonizadores e os colonizados. Além disso, nenhuma palavra da língua portuguesa inicia com ‘ç’ e nem há provas de que tenha havido tribos indígenas com alfabeto próprio. Ou seja, quando os colonizadores chegaram à região, cada tribo tinha uma linguagem própria, mas ninguém sabia escrever. “Não há registro que nossos indígenas amazônicos usavam alfabeto (e se usavam o mesmo se perdeu há muito tempo atrás) e tão pouco escrevessem, por isso é impossível conceber a ideia do indígena utilizando uma grafia para escrever a palavra Sairé”, descreve Canto na obra.
Ele afirma ainda que a grafia ‘Çairé’ não existe na linguagem nheengatu. De acordo com a obra do padre, a palavra com ‘ç’ apareceu pela primeira vez em 1875, mais de cem anos antes da primeira publicação da palavra ‘Sairé’.
Para a antropóloga da Ufopa, Luciana Carvalho, na pesquisa em parceria com o Iphan, foram encontrados registros do nome com as duas formas. Segundo ela, não há problema em relação à linguagem, pois é uma forma com a qual as pessoas envolvidas com a festa demonstram querer ser representadas. “Tudo bem que não se escreve com ‘ç’ na língua portuguesa, mas nesse caso é cabível. É como as pessoas assumem posições, representa a ancestralidade, remete à origem indígena”, afirma.
O G1 tentou contato com o professor Edilberto Ferreira que defende a grafia com o 'ç', mas não conseguiu até a publicação desta matéria.
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