segunda-feira, 14 de setembro de 2015

PARÁ: Tapajós, Carajás, quatro anos de uma derrota anunciada


Por M. Dutra

Há quatro anos dava-se início à 

campanha do plebiscito pela

divisão territorial do Pará. De lá 

até agora, o assunto como 

que morreu tanto nas zonas de 

influência de Marabá como 

de Santarém, as cidades que, 

em 

2011, buscavam o status 

de capitais do Oeste e do Sul/Sudeste paraenses.


Para os estados que contam hoje com mais representantes na Câmara como São Paulo e Minas Gerais, essa possibilidade de alteração numérica nos plenários do Legislativo suscita desconfianças quanto à manutenção de seus tradicionais esquemas de influenciar as demais bancadas em votações que interessam a paulistas e mineiros.
Para os representantes dos estados mais desenvolvidos, o eventual surgimento de novas bancadas em Brasília traz o receio de que isso incentive outras demandas regionalistas. Além do caso de Tapajós e Carajás, em véspera de plebiscito, existem outras 11 demandas por autonomia em outras áreas do país – algumas mais adiantadas, outras ainda no campo das intenções.
Para os defensores da divisão, a autonomia dessas duas regiões paraenses será o ponto de partida para o desenvolvimento e para a afirmação regional de suas identidades. Como se sabe, a Amazônia é um imenso território com mais de 20 milhões de habitantes, onde convivem culturas as mais diversificadas, com particularidades locais, hábitos e modos de falar diferenciados.
Belém, a capital paraense, desempenha historicamente um papel extremamente centralizador. Ali vive uma elite tradicional, com muitos descendentes de colonizadores portugueses, que desconhecem o interior da região, olhando mais para a Europa e para os Estados Unidos do que para dentro do próprio estado.
Os oponentes do movimento pela divisão entendem que o esforço pela separação se deve à ação do que eles chamam de ‘aventureiros’, grupos de poder que pretenderiam afirmar-se nacionalmente a partir de suas posições políticas nos novos estados, onde os processos de manipulação eleitoral e exercício do poder lhes seriam mais favoráveis do que no âmbito do Pará atual.
Se observarmos essa demanda separatista interna pelo ângulo da ciência política ou da sociologia, veremos que se trata de um claro fenômeno de regionalismo, isto é, de ação política, em determinado território, com vistas à afirmação de elites localizadas que buscam diferenciar-se de outros territórios, notadamente daqueles que exercem o poder hegemônico sobre a região que busca autonomia.
O sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002), no livro O poder simbólico, abordou as dificuldades de estudar o conceito de região em virtude da “confusão dos debates” em torno do que isso de fato significa. Várias disciplinas se ocupam desse conceito, que se mostra como uma espécie de síntese de formação social, econômica e histórica dentro de um espaço específico.
Em meio a discursos os mais diferenciados, os separatistas buscam, em essência, construir uma estratégia de legitimação de sua demanda. Desejam dar a conhecer ao país que seu território, ou sua região, tem especificidades, uma identidade que necessita afirmar-se, e sempre aludem a um direito historicamente adquirido.
No caso das duas regiões paraenses, há distinções nas demandas atuais. A luta do Tapajós vem do meado do século 19, após a criação da província, hoje estado, do Amazonas, desmembrado do antigo Grão-Pará, no mesmo momento em que se discutia a criação da província do Paraná, desmembrada do território de São Paulo. Essas duas decisões do imperador Pedro II produziram acalorados debates no Parlamento imperial, com prós e contras, mais ou menos como nos dias de hoje em relação ao Carajás e ao Tapajós. Os que se posicionaram contra as divisões diziam quase a mesma coisa que os oponentes de hoje: que as novas províncias seriam um pesado ônus ao Estado brasileiro, que se tratava de interesses eleitoreiros e que só serviriam para beneficiar as elites locais.
Já a região de Carajás é objeto de uma demanda recente, iniciada na década de 1980, sob a influência dos investimentos federais na região sul/sudeste do Pará, em torno do chamado Projeto Grande Carajás, que atraiu grande número de empresas para aquela região, sobretudo mineradoras. Mais tarde, surgiu nessa região uma pujante pecuária, a melhor da Amazônia. Decorreu daí a formação de uma elite relativamente rica, formada por imigrantes de várias regiões, notadamente do centro-sul do país. Essa elite e a massa da população imigrante, vinda do Nordeste e do Centro-Oeste, mantêm fortes laços com seus estados de origem, e Belém pouco significa para os ocupantes de uma região que cultiva outros hábitos, sem afinidades com a cultura e as tradições paraenses.
Não será, pois, pacífica a presente luta por emancipação, haja vista a tradição de centralização do Estado brasileiro. O Tapajós tem um direito histórico adquirido. Ali as ideias de autonomia fizeram parte da cultura local por gerações. Há riscos? Sim. Há aventureiros? Sim. E em que tipo de luta política eles não estão presentes? Um dos produtos dos eternos aventureiros, dos tantos que existem por este Brasil imenso, foi a alteração do projeto original de criação do estado do Tapajós, apresentado nos anos 1990 no Congresso, que agora passou a incluir a região do Xingu.
No aspecto da geografia política regional, se, após o plebiscito, Tapajós e Carajás se tornarem estados, pouco mudará para vastas regiões das novas unidades, distantes da atual capital do Pará. As distâncias físicas das eventuais novas capitais, Santarém e Marabá, em relação a diversas áreas dos novos estados, serão semelhantes às que existem hoje entre essas áreas e Belém.

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